sábado, 2 de janeiro de 2010

CAMINHO PRIMITIVO



Caminho Primitivo

Esta última aventura a que me propus, e da qual consegui realizar uma grande parte, roçou as fronteiras do razoável a nível do que é permitido pelo “sociologicamente” correcto. Digamos que, mais, seria condenável pela sociedade em que estamos inseridos, e à qual damos algumas justificações.

- Agora pergunto! – Será que nos devemos reger pelos padrões dessa sociedade, ou por outro lado, criar os nossos próprios limites, e através deles, testarmo-nos e elevarmos os nossos patamares de exigência?

P.S.I. (“Post Script um Intercalar”) – Este discurso assenta num pressuposto, de que eu julgo saber os valores pelos quais me rejo, e com os quais tenho consciência (… ou devia ter) que não corro perigo. Podem julgar… Alguns fá-lo-ão… Que corro riscos desnecessários. Aos que me estão mais próximos, e pela minha “paz” temem, digo que, embora não pareça, há certos riscos que não corro, e esses, apesar de ser eu quem os define, tenho a certeza que chegam para não causar arrelias a quem me quer bem. (fim de P.S.I.)

É um pouco por isso, ou se quisermos, por falta de coragem, que fiz grande parte deste meu “último” Caminho, por estrada. Apesar de possível (haverá impossíveis nos Caminhos?), não seria viável a um ser humano fazê-lo em 3 ou 4 dias, principalmente nas condições (e com as condições) em que se desenrolou este périplo.

Na primeira metade desta minha aventura as temperaturas não andaram muito longe da dezena de centígrados, acompanhados aqui e ali por alguns tímidos chuviscos e algum (não muito) vento. A neve, essa, sempre presente em todas as montanhas que esgrimiam com o céu a mais de 800 mt de altitude, já por mim tinha sido passada, em grande parte, no matar saudades que foi o regresso a Leon, e, pelo belo trajecto de comboio que dessa capital de província fiz, até outra não menos famosa, também ela metrópole e outrora bastião de defesa cristã, que por detrás das cordilheiras, contra os povos invasores do Norte de África resistiram, ganharam “alma” e contra-atacaram.

Claro que sempre que ia aos trilhos do Caminho, tal ensejo ficava pejado de muito “barrio” e muita dificuldade. Estamos a falar do Caminho de Santiago mais complicado. Digo-vos com algum conhecimento de causa, mas principalmente por ser o trajecto que em valores percentuais, mais acumulado montanhoso possuí. Falo-vos de cerca de 300 km’s de média e alta montanha, num sobe e desce constante acima dos mil metros.

Ainda para piorar mais as “coisas”, os 3º e 4º dias foram cumpridos em condições climatéricas muito exigentes, adversas no que ao Vento (soprou mais forte); Chuva (caiu com muito mais intensidade); e ao Frio (deixou de dar tréguas), diz respeito. Aliado a isso tudo, as altimetrias acentuaram-se ainda mais.

Muitas vezes, a consciência de que a muito custo e sofrimento, ou sem eles, mais tarde ou mais cedo vamos reconfortarmo-nos com um quente banho num qualquer albergue, e que, tais adversidades não perdurarão eternamente, não é suficientemente reconfortante para que não nos ponhamos a pensar se valerá a pena continuar naquelas condições.

Numa Peregrinação em Bicicleta, apesar das médias de andamento serem para mais do dobro em relação a outras formas de progressão, muitas vezes as dificuldades são inversas a essa proporção. – Sim! – Eu sei que o caminhar a pé encerra dificuldades muitos mais tormentosas… Mas, ocasionalmente, o sermos nós mais a “máquina” é como que um empecilho. Afinal, este objecto que nos dá “asas” e nos é querido, sempre é algo que depende da nossa força para avançar. - Apesar das duas rodas, é um “peso morto”.
- É isso aí! Muitas vezes uma Bicicleta em Peregrinação é quase como um “filho” que não queremos deixar para trás.

Assim, de repente…
…Valeu pela experiência, pelas dificuldades encontradas, mas sobretudo pelas que tiveram que ser desenrascadas para colmatar outras tantas situações, que aos meus olhos eram completas novidades. Só perante estas é que poderemos auferir realmente as nossas capacidades, e prepararmo-nos para outras ainda mais adversas.

… é só mais uma história para contar aos netos…

P.S.F. (…final) - Quem quiser fazer um Caminho de Santiago no inverno, com condições de inverno, informe-se o melhor que possa e trate da logística tão bem quanto possa. Depois…
…Como diria o meu novo Amigo Victor, artista pintor, que nas horas menos vagas é um responsável elemento da protecção civil, que desde Fonsagrada, rege e protege os mais desprevenidos e acidentados nas zonas montanhosas referidas:
- Passar incólume por um Caminho destes, nesta altura, é um autêntico milagre. A qualquer altura estará uma tempestade à tua espera.

Aos Amigos do Grupo de Málaga: - Espero que tenham chegado a bom porto, escapando tanto quanto possível, ao que acabei de citar.

Do Guarda Rios… Agora mais… Quebra-gelo.

1 comentário:

Ricardo Rosa disse...

Quero antes de mais, enaltecer o facto de o meu querido amigo e companheiro destas andanças, ter tido a ousadia de percorrer tal caminho nas condições climatéricas que este fim de ano o São Pedro nos brindou.
Dito isto gostaria também de deixar bem expresso, que quem dicide os limites é sempre o próprio, por vezes existem imponderáveis aos quáis nós somos alheios e que levam a que as surpresas desagradáveis acomteçam.
Mais uma vez lhe desejo um excelente Ano de 2010 Com Muita Saúdinha da Boa!